O Guardião
A extrema bondade sempre teve contra-indicações: as dores da inveja. Distinguia-se em tudo. Nos passos leves, na voz pálida, nos gestos sussurrados, nos sentimentos raros. Em toda a região não havia quem lhe ficasse indiferente. No convento, no painel de arte sacra que embelezava o refeitório, mal Frei Guardião entrava, o Menino parava de espernear ao colo da Virgem Maria. E, nos habituais passeios diários, até a própria natureza se manifestava. As árvores, os arbustos, as flores, as ervas de cheiro comportavam-se como educados discípulos: mesmo não se mexendo, viravam-se para o cumprimentar e dar-lhes as boas vindas.
Os animais corriam, voavam e rastejavam na sua direção, atirando-se para o seu colo ou rebolando-se a seus pés. Aquele homem
de Deus tinha mel, mas pior perigo do que as picadas das abelhas, eram as ferroadas dos homens. Enquanto uns respiravam a sua bondade, sabendo que é isso que realmente distingue o poderosos dos fracos, outros torciam-se com as dores da inveja. Para esses, Frei Guardião fazia tudo para se tornar transparente. E era sem querer ser visto que mostrava a sua superioridade.